A Covid-19 é uma doença nova, do qual sabe-se muito pouco. Não se sabe com certeza, por exemplo, quanto tempo vai durar a imunidade daqueles que já contraíram a doença – uma informação importantíssima para se calcular quando as medidas de distanciamento social não serão mais necessárias.
Locais como Nova York, Espanha e Itália dão sinais de que o pico da pandemia já teria passado (embora isso não signifique que os cuidados devam ser relaxados), e o debate sobre levar as pessoas de volta às ruas tem se intensificado. As pessoas que já foram contaminadas com o novo coronavírus já podem voltar às suas atividades normais?
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“A imunidade após qualquer infecção pode variar de uma vida inteira a quase inexistente”, explicou o epidemiologista Marc Lipsitch, em entrevista ao New York Times. “Até agora, no entanto, apenas os primeiros dados estão disponíveis sobre imunidade ao Sars-CoV-2, o coronavírus que causa o Covid-19″, completa.
Estar imune agora não necessariamente significa que você o estará para sempre. Especialistas apontam para todos os fatores que ainda permanecem desconhecidos: a possível proteção contra a Covid-19 será de curta duração ou apenas para algumas pessoas infectadas? O conceito de imunidade é muito amplo: em uma extremidade está o que é chamado de “imunidade esterilizante”, em que a exposição a um patógeno tende a induzir uma proteção ao longo da vida, como no caso do sarampo. No outro extremo, não há imunidade e o histórico de doenças anteriores não faz diferença – ou pode até piorar as coisas, como no caso da dengue.
Outra questão é a velocidade com o que o vírus pode mudar. O vírus da poliomielite, por exemplo, não sofre mutação rapidamente. Portanto, uma vacinação contra a poliomielite (que estimula o corpo a produzir novos anticorpos) geralmente dura a vida inteira. Mas outros vírus, como a gripe, sofrem mutações constantes e exigem a vacina anual que está sendo aplicada em diversas cidades no Brasil.
Especialistas dizem que o Sars-CoV-2 provavelmente cai em algum lugar no meio, de modo que as pessoas expostas não estão totalmente esterilizadas contra outras doenças nem deixadas indefesas. Em vez disso, elas entram em um estado imunológico cuja proteção diminui com o tempo e pode variar de acordo com a genética e o sexo do paciente (as mulheres tendem a ter reações imunes mais fortes que os homens), a força de sua resposta imune inicial e as características do próprio vírus, à medida que ele continua a evoluir.
O CDC (Centers for Disease Control) o órgão federal do governo dos EUA encarregado da prevenção e combate a epidemias, por exemplo, começou a recrutar americanos para ver quem foi infectado e produziu anticorpos. Pessoas infectadas com Sars desenvolveram imunidade por uma média de dois a três anos. “Estamos bastante certos de que as pessoas estão se tornando imunes ao novo coronavírus”, explica o médico Vince Silenzio, da Escola de Saúde Pública Rutgers.
A verdade, como dito no início, é que se sabe muito pouco sobre o vírus. Estudos anteriores de coronavírus menos perigosos sugerem que a proteção tem vida curta: os níveis de anticorpos caem significativamente em poucos meses. Um estudo de 1990 reexpôs nove pacientes que desenvolveram um resfriado leve ao mesmo coronavírus um ano depois. Seis deles desenvolveram um novo surto de infecção, apesar de serem contagiosos por um período mais curto desta vez.
O quão doente você ficou com a Covid-19 pela primeira vez também pode fazer a diferença. Aqueles que se recuperam de casos graves podem ter imunidade mais forte do que aqueles que são assintomáticos. Um relatório da Coreia do Sul constatou que 91 pacientes que se recuperaram do Sars-CoV-2 apresentaram resultado positivo posteriormente, sugerindo que foram infectados novamente ou que a primeira infecção foi reativada. Também houve relatos de possíveis reinfecções da China e do Japão.
Uma explicação para esses incidentes é que eles não são um sinal de que as pessoas estão sendo infectadas, se recuperando e sendo infectadas novamente, mas que os testes tiveram problemas, como falsos negativos. Uma possibilidade intrigante é que a exposição prévia a outros coronavírus oferece um pouco de proteção. O virologista da Universidade de Tulane, Robert Garry, observou que alguns pacientes com Covid-19 montaram o mesmo tipo de resposta imune que você esperaria de alguém que experimentasse uma nova infecção.
“Obviamente eles não haviam sido infectados com Sars-CoV-2 antes”, afirma Garry, mas pode ser que o novo vírus seja semelhante o suficiente aos coronavírus sazonais que causam o resfriado comum e desencadeiam uma resposta de memória. Isso poderia explicar por que os casos de Covid-19 parecem ser menos graves em crianças do que adultos: talvez elas tenham maior probabilidade de ter tido exposição recente a outros coronavírus.
Pode haver ainda diferenças genéticas que dificultam a infecção das células pelo coronavírus. Também é possível que pessoas com infecções mais leves tenham sido expostas apenas a uma pequena quantidade do vírus, diferente de, por exemplo, um médico que está sendo pulverizado com milhões de partículas virais. “É possível que pessoas assintomáticas tenham sido expostas a uma dose muito menor”, acredita Brian Baker, bioquímico da Universidade de Notre Dame.
As respostas definitivas só virão com o tempo e mais pesquisas. Mas nem sempre a notícia pode ser boa. A verdade é que nossas respostas imunes a esse vírus provavelmente não são permanentes ou perfeitas.