Mais um número triste marca a pandemia no Brasil a partir de hoje: ultrapassamos os 300 mil mortos por Covid-19. Somos o segundo país com mais vítimas fatais da doença em todo o mundo, atrás apenas dos EUA. E não chegamos aqui por acaso: as falhas se acumulam desde que os primeiros casos de infecção pelo novo coronavírus foram detectados no país.
Apesar de ter a chance de usar os aprendizados vistos em outras partes do mundo, o que se viu aqui no Brasil foi uma sucessão de erros na condução da política de combate à Covid-19. Para começar, sofremos com a falta de um órgão global de referência, já que a Organização Mundial da Saúde (OMS) foi desmoralizada por motivos políticos. “Enfraquecemos a OMS no momento em que ela não poderia ser enfraquecida”, avalia Sergio Siqueira, professor do curso de Farmácia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR).
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Siqueira diz que a OMS deveria fazer a coordenação dos esforços de combate à pandemia em nível mundial. “O enfraquecimento dessa entidade não interessa a ninguém, muito menos em um momento crítico como o de uma pandemia”, destaca. O fato de não haver um órgão aceito por todos os países em posição de liderança foi o primeiro problema que enfrentamos.
Início parecia seguir a Ciência
O início do enfrentamento à doença por aqui parecia até ir bem: com o médico Luiz Henrique Mandetta à frente do ministério da Saúde, os pronunciamentos sobre o desenvolvimento do combate à pandemia eram diários e as primeiras decisões tinham a Ciência como base. Depois dele, a condução do órgão foi assumida pelo também médico Nelson Teich, mas sua passagem pelo ministério foi curta: apenas 29 dias.
O próximo titular ficou como interino por vários meses, apesar de não ser ligado à área de saúde: Eduardo Pazuello é um especialista em logística do Exército. “Isso tudo levou a uma descoordenação total. Não sabíamos se comprávamos vacinas, se dávamos hidroxicloroquina, se comprávamos respiradores… O governo brasileiro atuou de forma reativa, não preventiva, como deveria ter feito”, analisa Siqueira.
Vale lembrar que a prevenção, tanto em nível individual quanto governamental, foi o que fez a diferença em outros países. Na China, por exemplo, onde a pandemia foi identificada pela primeira vez, a disciplina da população ao seguir as orientações das autoridades fez toda a diferença na contenção da disseminação da doença.

Nos EUA, por sua vez, o espalhamento do novo coronavírus não foi contido com eficiência, mas a compra de milhões de doses de vacina antecipadamente – e o investimento no desenvolvimento de imunizantes de vários fabricantes – agora faz a diferença: o país já começa a vacinar a população em geral acima de 16 anos. “Aqui, a falta de coordenação culminou na dificuldade de acesso às vacinas, na desmobilização da população, que ficou em dúvida se deveria ouvir A, B ou C, e isso criou a tempestade perfeita. Enquanto isso, o ministério parece que fica assistindo para ver o que acontece.”
Situação atual foi prevista
Siqueira lembra que todos os cientistas e pesquisadores já haviam previsto que a situação chegaria a esse ponto. “Infelizmente, parece que a ideia foi: ‘vamos ver se acontece mesmo e, se acontecer, a gente vê o que faz’. Está aí agora: enfrentamos esse drama e, além dos pacientes e das vítimas, temos profissionais da saúde totalmente arrasados. É uma pena que tenha chegado a esse ponto, mas o motivo sabemos qual foi.”

Enquanto isso, a campanha de vacinação segue lentamente no país e muitos ainda não têm qualquer previsão de quando receberão o imunizante. É preciso, então, que todos – mesmo os que já receberam as duas doses de vacina – mantenham as medidas de prevenção: distanciamento social, uso de máscaras e higiene frequente das mãos.